O que são as Ciências Ômicas?

Nos últimos anos, as chamadas Ciências Ômicas (áreas de estudo cujos nomes terminam com “-ômica”, ou “-omics”, do inglês) se tornaram proeminentes dentro da Biologia como uma nova fase dos estudos sobre a genética dos seres vivos. Atualmente esses campos de conhecimento estão se expandindo de forma acelerada e novas vertentes surgem a todo momento. 

As ômicas – entre elas a genômica, a transcriptômica, a metagenômica, a proteômica e a metabolômica – surgiram com a integração de grandes volumes de dados aos estudos das ciências biológicas sobre o DNA. Nesse sentido, bioinformática e biologia computacional estão intimamente relacionadas às Ciências Ômicas.

Nos estudos sobre os microrganismos, microbiomas e suas relações com hospedeiros e ambientes, as Ciências Ômicas são imprescindíveis. Para entender as funções de comunidades complexas de microrganismos junto a plantas – e, consequentemente, o papel funcional de seus genes –, a análise de grandes volumes de dados genômicos é essencial. Só assim é possível desenvolver produtos biológicos efetivos, seguros, escalonáveis e que tenham efeitos positivos em sua aplicação, inclusive na agricultura.

Conheça a seguir um pouco mais sobre algumas das Ciências Ômicas.

 

Genômica

Compreendem os estudos de toda informação hereditária de um organismo, codificada em seu DNA e transcrita em seu RNA, incluindo sequência de nucleotídeos, mapeamento de genes e funções. Trata-se de campos que se expandiram muito nas últimas décadas, impulsionados pelas novas tecnologias de sequenciamento genético e de análise de dados.

A genômica foi a primeira que surgiu entre as Ciências Ômicas, concebida pelo avanço das tecnologias de sequenciamento a partir da década de 1970. Outro marco importante para a genômica foi a criação de máquinas para sequenciamento automático de DNA, o que acelerou muito o processo de mapeamento do genoma. Tais avanços também impulsionaram o Projeto Genoma Humano, uma iniciativa internacional surgida em 1990 e finalizada em 2003 – com as últimas conclusões publicadas ainda recentemente, em março de 2022, na revista Science –, dando início a diversas outras iniciativas de sequenciamento de DNA. É o caso do Projeto Microbioma Humano, que se propôs a sequenciar e mapear todos os microrganismos que habitam os diferentes órgãos e tecidos humanos. O projeto foi finalizado em 2016.

Edição genômica

Não apenas o conhecimento sobre os genomas se expandiu, mas também a capacidade de manipulação do código genético. A edição genômica através de CRISPR (do inglês clustered regularly interspaced short palindromic repeats) já permite, entre outras aplicações, o desenvolvimento de plantas que apresentam maior produtividade ou tolerância a estresses ambientais. E o Brasil é pioneiro nesse sentido: em 2021, cientistas da Embrapa anunciaram o desenvolvimento da primeira cana-de-açúcar editada do mundo, com maior concentração de sacarose nos tecidos vegetais, facilitando a produção de etanol e outros produtos, sem DNA exógeno à planta.

A técnica de edição genômica foi reconhecida como uma das grandes descobertas científicas do século, inaugurando uma nova fase da engenharia genética. O desenvolvimento da edição genômica por CRISPR rendeu às pesquisadoras Emmanuelle Charpentier e Jennifer Doudna o Prêmio Nobel de Química de 2020.

canas editadas pela emprapa
Campo de fenotipagem de canas-de-açúcar editadas por pesquisadores da Embrapa Agroenergia. As variedades são denominadas Cana Flex I e Cana Flex II. (Foto: Hugo Molinari/Embrapa)

 

Transcriptômica

A transcriptômica se dedica ao estudo da transcrição do código genético. O RNA nada mais é do que a versão transcrita do DNA e age como molde para síntese das proteínas que compõem os diferentes órgãos, tecidos e moléculas de um organismo. Por isso, muitas das pesquisas que envolvem transcriptômica são voltadas para o entendimento de como variações em sequências de DNA impactam a expressão gênica. Ou seja, uma vez que a informação presente no código genético é traduzida por fim em proteínas, como a transcrição de DNA em RNA influencia o funcionamento de um organismo. Os estudos em transcriptômica podem envolver as diversas classes de RNA, como é o caso dos RNAs mensageiros (mRNAs) e microRNAs (miRNAs).

 

Metagenômica e metatranscriptômica

Metagenômica e metatranscriptômica são, respectivamente, as análises do código genético (DNA) e de sua transcrição (RNA) a partir de amostras ambientais, contemplando todos os organismos ali localizados. Muito utilizada no estudo dos microbiomas, a metagenômica consiste em decifrar a “sopa” genética formada por diferentes organismos habitantes de um mesmo ecossistema e por seus genes. Essa abordagem provê valiosos conhecimentos sobre semelhanças e diferenças genéticas entre os microrganismos, bem como sobre suas funções junto a outros seres vivos.

Antigamente, o estudo dos microrganismos era essencialmente restrito a culturas axênicas (ou seja, puras), obtidas a partir de metodologias para isolamento microbiano em meios de cultivo. Mas não foi até a década de 1990 que o sequenciamento total de amostras ambientais se tornou uma possibilidade. A metagenômica surgiu como uma importante ferramenta para entender e caracterizar a presença e diversidade de comunidades microbianas em ambientes ou hospedeiros. Conhecida também como genômica ambiental, a metagenômica é muito utilizada para investigar o microbioma humano, entendendo suas características, relações com doenças e também como ferramenta para a medicina de precisão.

 

Proteômica e metaproteômica

Indo um passo além, a proteômica é um termo guarda-chuva para o estudo – identificação e caracterização – das proteínas presentes em um organismos, ou no caso da metaproteômica, comunidades de microrganismos. Com a metaproteômica de solos, por exemplo, é possível identificar proteínas acumuladas por organismos, permitindo a caracterização das funções bioquímicas presentes em um ambiente.

A metaproteômica viabiliza a investigação das comunidades microbianas no que se refere aos produtos gênicos, contribuindo particularmente para o entendimento sobre o conjunto de proteínas produzidas por um organismo. Esse tipo de abordagem também já permite análises aprofundadas dos microbiomas, possibilitando a investigação das interações entre diferentes microrganismos e caracterização de sua fisiologia e metabolismo – este último, alvo de estudo da metabolômica.

 

Metabolômica

A metabolômica é a abordagem utilizada para identificar o resultado de vias e processos metabólicos, associando atividades de pequenas moléculas que atuam no interior das células, tecidos e órgãos – os metabólitos – à resposta a alterações em sistemas biológicos. Essa análise pode ser realizada em organismos complexos, como seres humanos, ou em comunidades de microrganismos.

A metabolômica aplicada aos microrganismos é uma área recente, mas que tem potencial para diversas aplicações, considerando o papel dos microbiomas na modulação do metabolismo de outros organismos, como as plantas. Trata-se de um campo que vem se estabelecendo nos últimos anos e está na ponta final das análises de subprodutos pesquisados pelas “ômicas” – seguindo o fluxo de informações do código genético, compreendido por DNA, RNA, proteínas e metabólitos. As análises metabolômicas são frequentemente combinadas com outras Ciências Ômicas, como a transcriptômica, para geração de dados mais robustos.

 

Multiômicas

A junção de duas ou mais dessas áreas é denominada de multiômica, considerando a importância da multidisciplinaridade entre os campos de conhecimento e o grande volume de dados necessário para insights sobre o funcionamento de sistemas biológicos a partir de seu código genético, composição bioquímica e estímulos ambientais.

As multiômicas têm sido apontadas como parte do caminho para o futuro da biotecnologia, seja em aplicações para a saúde humana, agricultura ou até mesmo para o meio ambiente. A combinação dessas áreas é o que há de mais avançado dentro da Biologia e possibilita uma visão ampla e mais precisa dos processos biológicos, suas causas e resultados. Essas análises andam de mãos dadas com campos como a ciência de dados e a bioinformática, devido aos grandes volumes de dados gerados a partir das “ômicas”.

Apesar do constante desenvolvimento necessário em todas essas vertentes de pesquisa, já é possível vislumbrar grandes aplicações biotecnológicas a partir das Ciências Ômicas. No caso da agricultura, o desenvolvimento de produtos biológicos de nova geração e outras tecnologias baseadas em microbioma é altamente dependente do conhecimento gerado a partir das análises “ômicas”.

 

Principais referências

Krassowski, M.; Das, V.; Sahu, S. K.; Misra, B. B. State of the field in multi-omics research: From computational needs to data mining and sharing. Front Genet. (2020). https://doi.org/10.3389/fgene.2020.610798

Kleiner, M. Metaproteomics: Much more than measuring gene expression in microbial communities. MSystems (2019). https://doi.org/10.1128/msystems.00115-19

Rochfort, S. Metabolomics reviewed: A new “omics” platform technology for systems biology and implications for natural products research. J. Nat. Prod. (2005). https://doi.org/10.1021/np050255w

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