Soluções Baseadas na Natureza: definições e práticas

Você sabe o que são as Soluções Baseadas na Natureza (SBN)? O conceito guarda-chuva foi criado pela União Internacional para a Conservação da Natureza (UICN) e se refere às ações e tecnologias para manejar de forma sustentável, proteger e restaurar ecossistemas afetados por atividades humanas. Essas soluções têm potencial para beneficiar a sociedade e a natureza ao mesmo tempo. Por isso, são apontadas como um caminho para lidar com problemas globais associados à degradação ambiental e emissão de gases de efeito estufa (GEEs).

As Soluções Baseadas na Natureza (SBN, ou NBS, do inglês Nature-Based Solutions) são aplicadas tanto no campo como na cidade e são benéficas para a biodiversidade, assim como para atividades econômicas e produtivas. Recentemente, esse tipo de solução tem sido adotada pela indústria como resposta à demanda por mais sustentabilidade, considerando a resolução de problemas enfrentados no âmbito das cidades, indústria, agricultura, entre outros. Nesse sentido, as SBN abrangem, por exemplo, abordagens restaurativas do meio ambiente a fim de proteger regiões de eventos climáticos extremos.

São alguns exemplos de Soluções Baseadas na Natureza:

  • Reuso de água no contexto doméstico ou industrial;
  • Conservação de mata nativa para evitar erosão de regiões habitadas;
  • Restauração de ecossistemas e preservação de parques ecológicos para melhora de microclima das cidades;
  • Áreas verdes para aumentar permeabilidade das cidades e evitar alagamentos;
  • Conservação da biodiversidade em reservas e habitats naturais para diminuir contato de vetores de doenças com seres humanos;
  • Tecnologias que mimetizam ou são baseadas em processos naturais a partir do estudo da biodiversidade e sua evolução.

Em suma, as Soluções Baseadas na Natureza fazem a conexão entre meio ambiente e comunidades, resolvendo problemas com soluções que se inspiram em processos que já ocorrem. Muitas dessas abordagens também são eficientes em termos de custos, uma vez que já existem previamente na natureza e são redirecionadas para solução de problemas socioeconômicos.

Esse uso dos processos naturais para resolução de problemas sociais é apontado por organizações internacionais como uma das alternativas para lidar com questões globais, como as mudanças climáticas, aumentando a sustentabilidade de diferentes atividades produtivas.

 

Soluções Baseadas na Natureza contra a crise climática no contexto da ONU

A noção de que a preservação e o equilíbrio dos ecossistemas pode trazer grandes benefícios à sociedade é um dos pilares das SBN. Pensando nisso, o termo ganhou destaque institucional na 26ª Conferência das Nações Unidas sobre Mudança do Clima (COP26), ocorrida em 2019. As SBN foram apontadas pela Cúpula do Clima como uma das nove estratégias prioritárias para enfrentamento das mudanças climáticas.

Em manifesto produzido como parte das discussões durante a COP26, a ONU classificou as SBN como “um componente essencial do esforço mundial para alcançar as metas do Acordo de Paris” e conclamaram as nações a “ampliar as SBN para mitigação, resiliência e adaptação em áreas-chave, garantindo a subsistência das populações em face das ameaças climáticas”. Entre as áreas apontadas pelo documento estão infraestrutura, desenvolvimento sustentável, restauração ambiental e agricultura.

Apesar da crescente importância do conceito no âmbito da mitigação e adaptação aos efeitos causados pela crise climática, ainda há muito espaço para implementação das SBN por governos e empresas. O Relatório sobre a Lacuna de Adaptação, lançado em 2020 pelo Programa das Nações Unidas para o Meio Ambiente (PNUMA), indicou que para que as SBN alcancem seu potencial como parte dos esforços para cumprimento do Acordo de Paris, ações mais enérgicas para além de planos e documentos precisam ser tomadas. Isso inclui maior investimento e estímulo à inovação em diferentes áreas como uma das ferramentas para atingir os Objetivos de Desenvolvimentos Sustentável (ODS).

 

As lições da natureza para uma agricultura mais sustentável (e produtiva)

Quando se fala em Soluções Baseadas na Natureza no contexto da agricultura, temos um triplo benefício:

  • Conservação da biodiversidade e dos ecossistemas;
  • Sequestro de carbono e diminuição do impacto ambiental das atividades agrícolas;
  • Melhora da qualidade de vida e saúde de agricultores e da resiliência das culturas.

Nesse sentido, agricultores têm tirado lições da natureza para exercer um cultivo mais sustentável e que não crie mais problemas para a agricultura no futuro, além de melhorar a produtividade ou evitar perdas em diferentes contextos. Um trabalho publicado na revista científica Frontiers in Environmental Science mapeou, através de uma revisão de mais de 180 outros trabalhos científicos publicados, as principais funções exercidas pelas SBN na agricultura atualmente ou que são foco de pesquisas científicas para futura aplicação. Confira cinco delas a seguir.

1. Práticas sustentáveis

Agricultores que fazem uso de formas de manejo como agricultura regenerativa, agricultura de conservação ou agrofloresta. Na prática, os agricultores utilizam o próprio ecossistema presente, incluindo animais, plantas e microrganismos, além de seus serviços ecossistêmicos. Essas práticas incluem a rotação de culturas e o uso da biodiversidade nativa para enriquecer a terra com matéria orgânica e nutrientes.

2. Infraestrutura verde

Uso de determinadas espécies de vegetação, principalmente aquelas com tendência à formação de uma estrutura complexa de raízes, para estabilização de terrenos irregulares e evitar deslizamentos de terra, o que acarretaria em perdas de produtividade. Os autores do estudo apontaram que esse tipo de SBN indica uma perspectiva de “design de novos ecossistemas agrícolas”, utilizando recursos naturais para moldar o ambiente em favor da natureza, assim como da produção agropecuária.

3. Fitorremediação

Ao longo de sua evolução, as plantas encontraram sua própria maneira de restaurar ecossistemas. E é esse aspecto que é explorado em iniciativas de fitorremediação. Algumas dessas iniciativas e estudos utilizam determinadas espécies para dessalinizar solos, recuperar outros contaminados com excesso de pesticidas e até mesmo extrair metais pesados, como o mercúrio, de ambientes contaminados. No futuro, essas características podem ser potencializadas pela ciência para aprofundar o uso da fitorremediação como recurso para restauração de ecossistemas, beneficiando a agricultura assim como a natureza.

4. Biorremediação

Além das plantas, os microrganismos também têm grande importância na descontaminação e restauração de ecossistemas. De acordo com a pesquisa, esse tipo de abordagem tem sido alvo de diversas patentes depositadas, o que indica uma tendência de inovação por empresas e instituições de pesquisa. Mais especificamente, microrganismos como bactérias, algas, fungos e suas enzimas estão se tornando uma aposta como insumo para desenvolvimento de tecnologias capazes de remover poluentes – como alguns agroquímicos – de solos e rios.

5. Conservação da biodiversidade e mitigação das mudanças climáticas

Como uma atividade altamente dependente do contexto natural – como clima, solo, vegetação e condições bioquímicas – a agricultura só tem a ganhar com o manejo responsável dos recursos naturais, especialmente no longo prazo. Nesse sentido, a conservação da biodiversidade local por agricultores não tem apenas impacto na produtividade das lavouras, como também tem ganhado consequências positivas mais imediatas, como o reconhecimento e monetização de créditos de carbono e serviços ecossistêmicos. Apesar desses sistemas de precificação terem muito o que avançar ao redor do mundo, já estão se estabelecendo como tendência em diversos países, e a agricultura se mostra como parte essencial do processo.

A implementação dessas práticas, entretanto, não vem sem desafios. É preciso maior investimento e engajamento de governos, agricultores e instituições de pesquisa para que as SBN se disseminem na cadeia produtiva de alimentos e agropecuária.

 

Biotecnologia agrícola inspirada pela biodiversidade

Conforme as SBN ganham tração como alternativa para promoção da sustentabilidade na agricultura, novas tecnologias a partir de olhares para a natureza também são desenvolvidas. No caso da biotecnologia, cientistas aprendem com a biodiversidade para melhorar tanto a produtividade de plantações quanto sua tolerância a estresses ambientais. Essas inovações de base científico-tecnológica podem se inspirar em microrganismos, processos e genes presentes na natureza para solucionar problemas enfrentados hoje pela agricultura.

Pesquisadores e instituições como a Symbiomics utilizam ferramentas como a bioinformática e a genômica e processos como a bioprospecção microbiana para buscar e mapear microrganismos e seus genes com potencial para dar origem a produtos biológicos. Estes, por sua vez, serão capazes de tornar as plantas mais tolerantes à seca e outras adversidades, como aquelas causadas pelos eventos climáticos extremos.

As plantas, animais e microrganismos já existem há milhares de anos e desenvolveram diversas estratégias para enfrentar dificuldades para sobreviver. Estratégias essas que devem inspirar a humanidade a desenvolver processos, tecnologias e ferramentas com potencial para auxiliá-la a superar desafios enfrentados hoje e no futuro. 

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Principais referências

Simelton, E.; Carew-Reid, J.; Coulier, M.; Damen, B.; Howell, J.; Pottinger-Glass, C.; Van Der Meiren, M. (2021). NBS framework for agricultural landscapes. Front. Environ. Sci.. https://doi.org/10.3389/fenvs.2021.678367

Tiodar, E. D.; Văcar, C. L.; Podar, D. (2021). Phytoremediation and microorganisms-assisted phytoremediation of mercury-contaminated soils: Challenges and perspectives. Int. J. Environ Res. Public Health https://doi.org/10.3390/ijerph18052435

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